O Governo dos Estados Unidos anunciou sua decisão, ratificada pelo Congresso, de explorar os recursos naturais do espaço. José Monserrat Filho, ex-chefe da Assessoria de Cooperação Internacional da AEB – Agência Espacial Brasileira, critica a posição norte-americana, que “exige um amplo debate internacional”.
Com a aprovação do Congresso, os Estados Unidos se dizem referendados para iniciar a exploração de corpos celestes, mas Monserrat Filho, em entrevista exclusiva à Sputnik Brasil, sustenta que a posição dos Estados Unidos não poderia ter sido adotada unilateralmente, pois tudo que envolve a pesquisa e a exploração do espaço exige um amplo debate internacional nos organismos especialmente criados para estas negociações.
José Monserrat Filho é professor de Direito Espacial e durante alguns anos chefiou a Assessoria de Cooperação Internacional da AEB – Agência Espacial Brasileira e também a Assessoria Internacional do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. Ele é ainda vice-presidente da Associação Brasileira de Direito Aeronáutico e Internacional.
A seguir, a conversa com o especialista brasileiro em Direito Espacial.
Sputnik: Existem acordos, convenções ou instrumentos legais que permitam aos Estados Unidos ou a qualquer outro país fazer a exploração de recursos naturais no espaço?
José Monserrat Filho: Esta questão ainda não foi resolvida internacionalmente. Trata-se de uma questão internacional e não nacional. O espaço e os corpos celestes são considerados bens abertos a toda a humanidade. Logo, ninguém pode se apossar do espaço. O Tratado do Espaço de 1967, que é o código maior das atividades espaciais, diz claramente em seu Artigo 2 que o espaço cósmico, inclusive a Lua e os demais corpos celestes, não poderá ser objeto de apropriação nacional, por proclamação de soberania, por uso ou ocupação e nem por qualquer outro meio. A questão da propriedade privada para a exploração industrial e comercial dos recursos naturais dos corpos celestes, inclusive dos asteroides, ainda precisa ser devidamente regulada por ser uma questão específica.
S: Mas esta iniciativa dos EUA, inclusive referendada pelo Senado do país, é aceitável por parte da comunidade internacional?
JMF: Não sei como vão se portar os países aliados dos EUA, mas no geral se pode dizer que a maioria dos países será contra porque a lei internacional é muito clara neste sentido. Além do Tratado do Espaço de 1967, há também o Acordo da Lua, que foi aprovado por unanimidade pela Assembleia-Geral das Nações Unidas, em 1979, e assinado por uns poucos países. Os EUA e a Rússia não ratificaram esse acordo, mas de qualquer maneira ele tem um peso razoável e não pode ser ignorado, e diz claramente que a exploração dos recursos naturais dos corpos celestes – a Lua e asteroides – só poderá ser feita depois de criada uma autoridade internacional com a participação dos interessados. Ou seja, a proposta é criar um sistema como o que hoje administra as riquezas dos fundos marinhos e instituir uma autoridade internacional. E a empresa que estiver interessada em participar da exploração faz um estudo com a autoridade internacional que supervisiona essa exploração, de tal maneira que ela não prejudique os outros países.
S: Então, é preciso criar um organismo regulador?
JMF: A melhor solução, no meu entender, é aquela que foi proposta pelo Acordo da Lua, mas os países têm liberdade de discutir esta questão. O que não se pode de maneira alguma é estabelecer uma lei nacional para resolver um problema internacional. É uma pressão unilateral. Essa não é a primeira lei aprovada, nesta área, nos EUA. Recentemente foi aprovado pela Câmara dos Representantes um projeto de lei que diz claramente que quem chegar a um asteroide e recolher a sua riqueza será dono desses recursos. Como entender que um país possa estabelecer como serão explorados os asteroides, que são terras de todo o mundo, não pertencem a alguém em particular. É uma lei interna dos EUA, vale para qualquer empresa americana, mas está se sobrepondo aos demais países.
Nenhum comentário:
Postar um comentário